quinta-feira, 22 de março de 2012

Os Níveis de Transe/Êxtase da Ayahuasca/Yagé.

Ayahuasca é uma palavra quíchua para uma bebida ingerida em jagubetradições xamânicas, no intuito de se alcançar experiências místicas, visões. A palavra tucano para essa bebida é Yagé que é produzido a partir de duas plantas: o cipó Banisteriopsis caapi, conhecido como Jagube ou o Rei, e das folhas do arbusto Psychotria viridis, a Chacrona ou também conhecida como Rainha. Os métodos para preparo diferem muito em relação à ocasião ou a cultura local.

A cultura da Ayahuasca, do vinho das almas, tem efetuado uma Rainharevolução silenciosa dentro da cultura mundial e em especial na América do Sul.

As pessoas, em nossa cultura ocidental, têm buscado, através das práticas do xamanismo ancestral, alcançar uma nova compreensão deste mundo e de si mesmas, enquanto almas “mortas/adormecidas” experimentando a ilusão do plano material.

Cada cultura do yagé possui uma cognição muito próxima, mesmo em diferentes nações indígenas. Sua prática milenar transformou radicalmente estas culturas, através do acesso ao processo iniciático de ingestão da ayhuasca.

A aproximação da cultura ocidental/branca junto a estas culturas indígenas tem se mostrado, ayahuascahistoricamente, sempre desastrosa, inclusive para o meio ambiente. Por isso devemos tomar bastante atenção em nossa interferência a este, em especial com o Jagube, o cipó que possui um ciclo extremante longo de maturação e recuperação.

Nos últimos 65 anos, com o trabalho missionário iniciado por Mestre Raimundo Irineu Serra, fundador da linha do Alto Santo, o ocidente conheceu o culto Dai-me e, a partir disso, o Yagé tem sido assimilado e adaptado às mais diversas culturas.

Acredito na importância da ancestralidade, no caso, a sabedoria ayahuasca 1exercida pelos pajés e xamãs, pois existem vários princípios e segredos envolvidos tanto na produção, como nos rituais empregados para o consumo da ayhuasca. Tudo tem propósito: os sons, as músicas, as danças, as canções, os sentidos do olfato e oral, e os efeitos medicinais do Yagé.

Quando cheguei no Brasil em busca desta sabedoria na floresta Amazônica não foi fácil, pois ao invés de procurar o caminho mais fácil, que seria as organizações religiosas existentes, saí atrás desta cultura ancestral dos Tucanos.

ayahuasca 2A caminhada foi difícil e aprendi muito junto aos pajés, não só Tucanos, mas de outras etnias, como as sociedades ayahuasqueiras. Lembrando as palavras de uma conversa que tive com alguns desses sábios que ensinaram que, para se compreender o Yagé, são necessários cerca de 30 anos de base, questionei sobre este tempo e me disseram:

- “Se nós precisamos de 25 anos no mínimo para realizar Uin Kayabi (visão pura), porque vocês seriam diferentes ? Vocês se acham especiais ?”

Relato também vivenciado por vários buscadores como Terence Mckenna e Beatriz Labate em seus livros, de onde extraí definições linguísticas indígenas deste texto.

Devo reconhecer em minha caminhada 3 níveis de consciência, transe, êxtase, ... chame como desejar, dentro do processo de Yagé que assim me fora ensinado pelos mais velhos.

Os caminhos das visões dependem muito da egrégora manifestada durante os rituais. Os pajés destacam a importância do cantador, do tipo de cipó utilizado e do feitor do Yagé, mas, independente das variantes, os níveis da pae (embriaguez) se mantém.

1 – Pae Pepa (embriaguez boa)

É o início das alterações da percepção, começando com a audição, que passa a ouvir o que nossos olhos não vêm. É comum a pessoa perceber um atraso temporal ou mesmo os denominados relâmpagos acústicos e visuais, trazendo, muitas vezes, uma alteração da luminosidade existente.

Em uma segunda fase, os sons e notas tornam-se mais intensos e correspondem a uma maior fluidez emocional, podendo-se verificar a visualização sonora materializada. São os chamados kene, formas geométricas abstratas coloridas, ou não, que se manifestam.

Estas primeiras visões são chamadas de Dami (“transformação, visões, alteração”). Neste estágio, a percepção da ordem constituída sensorial se desfaz perante nossa face.

2- Pae Kayabi (embriaguez completa)

Neste segundo estágio de percepção, as damis (visões) tornam-se muito mais intensas, independendo dos olhos estarem abertos ou fechados. Neste momento realmente entramos no mundo dos espíritos, normalmente podemos nos ver fora do corpo ou como sendo os animais, montanhas, árvores ou mesmo a própria chuva.

Podemos viajar pelas estrelas, mundos desconhecidos, falar com todo um mundo de seres e espíritos raramente perceptivos ao homem comum. Realizamos uma nova dimensão de tempo, como que alongado.

ayahuasca 4As visões podem ser alteradas pelo som neste estágio, razão pela qual os pajés relatam constantemente a importância dos cantadores. Os cheiros deste mundo dos espíritos tornam-se perceptíveis ao usuário, que são impossíveis de se descrever. As sensações corporais tornam-se muito mais intensas e por vezes violentas. Os sentidos se misturam e destroem as barreiras de sua limitação. Assim, através dos olhos podemos ouvir, cheirar, tocar ou mesmo saborear.

As visões de nós mesmos representam o auge deste estágio. Somos levados a um renascer. As tribos ancestrais e muitos usuários relatam o famoso renascer alcançado após sermos engolidos pela sucuri celestial e novamente devorados pelo jaguar/onça, como a mitológica história da fênix: temos que resistir ao ardor tornando-nos cinzas.

Alguns destes processos são tão poderosos que voltamos com marcas corporais de tais realizações, como as famosas garras das onças. E, através da voz do cantador, podemos renascer, pois ele é o nosso guia dentro deste mundo e devemos buscar seguí-lo.

3- Uin Kayabi (visão pura)

Alguns participantes, dependendo de fatores normalmente individuais e/ou espirituais, podem alcançar a chamada Visão Pura, que é uma ausência completa de qualquer referência da nossa percepção.

ayahuasca 3O que realizei de compreensão deste estágio seria impossível de explicar atualmente de forma clara. Seria como no filme Matrix, quando o personagem Neo é levado a primeira vez por Morfeu (o senhor dos sonhos) a despertar dentro do programa base da Matrix, onde o nada se manifesta e como criadores podemos assim manifestar tudo, a velha máxima Maçônica em que somos o Arquiteto de nosso Mundo.

Mestra Maria Sabina sempre disse existir outro mundo, outra dimensão em que podemos entrar enquanto alma e quando nos tornamos reais mestres deste mundo dimensional, nosso corpo nos acompanha.

Lembrando as palavras dos mais velhos, temos muito a caminhar até realmente manifestar a verdade, retirando-nos deste mundo ilusório e temporal.

Por. MP Nuno Maha

Conheça nossas rodas de Yagé.

http://irmandadepolimata.blogspot.com.br/2012/03/ritual-de-yage7-de-abril.html